Há dois anos, o diretor Jordan Peele nos trouxe um suspense psicológico fenomenal em Corra!. O que começou como uma viagem tranquila de um casal ao interior se demostrou parte de uma trama macabra, capaz de mexer com a cabeça de qualquer um. Em Nós, temos igualmente uma família feliz viajando para descansar, mas os acontecimentos seguintes se mostram um verdadeiro pesadelo. A diferença é que aqui o diretor se afasta do psicológico e se aproxima do terror físico, explorando uma área diferente de seu primeiro filme. Mas será que esse novo estilo de narrativa funciona?

Com as maravilhosas Lupita Nyong’o (Pantera Negra) e Elisabeth Moss (The Handmaid’s Tale) no elenco, além de Winston Duke (Pantera Negra) mostrando uma outra face, temos a história da família Wilson que resolve passar o fim de semana na praia. Esse foi o mesmo local em que a personagem de Nyong’o, Adelaide, teve uma péssima experiencia quando criança ao se perder numa casa de espelhos e se ver de frente com uma criança idêntica a ela. Conforme a trama se desenvolve, descobrimos que aquela pessoa era real e também cresceu, e agora ela retorna juntamente com sua família – todos idênticos aos Wilson. 

A “cópia” de Ade se refere a ela mesma e seus semelhantes como sombras. Imaginando que Peele iria seguir o modelo de Corra! e partir para a parte psicológica, pensei que teríamos diálogos dessas duas partes de um mesmo ser – algo a ser enxergado com o potencial de ser integrado. Pensei que seria explorada essa experiencia individual de cada pessoa com sua sombra, algo que pode ser incrivelmente assustador enquanto ela reside em seu inconsciente, mas que perde poder ao ser encarada de frente.

No entanto, o diretor decide pegar outro caminho e se alinha com filmes de terror de décadas anteriores. Um caminho bastante válido e que com certeza irá trazer alegria para aqueles que gostam desse tipo de narrativa. Mas, para mim, essa característica não funciona. No terceiro ato do filme, tanto Corra! quanto Nós entra numa área “não realista”. A diferença é que o nonsense de Corra! possui uma lógica que faz sentido naquele universo, enquanto Nós larga os bets e só vai. Quanto mais pensamos no mistério quando ele é revelado, menos sentido ele faz.

Mesmo com essa característica de trama que não me agrada, é possível notar ainda presente muitas críticas sociais. Aqui elas não são tão evidentes, mas permanecem em todo o filme. Inclusive, os personagens negros são o único elemento que não trazem uma crítica, o que é ótimo. A crítica foca mais numa questão de subhumanidade que vai além de gênero ou raça; de seres humanos maltratados por seres humanos; aqueles que são consideramos menos que os outros e que não possuem o privilégio de aproveitar coisas “simples” como o Sol, as árvores, um prato de comida quente.  

A direção de Peele continua impecável, demonstrando grande habilidade em movimentos de câmera, montagem e efeitos sonoros. Eu entendo o caminho que ele escolheu, porém Nós não funciona na minha visão. Mas com certeza irei assistir seu próximo filme.