“Good Morning, Charlie!”

Três mulheres diferentes, que trabalham como espiãs/detetives, cada uma com a sua história, peculiaridades e todas incríveis. Fortes, inteligentes, justas, auto-confiantes, donas de si e ao mesmo tempo femininas, bonitas e com senso se moda totalmente style. As Panteras, no original Charlie’s Angel, é um tipo de trama de aventura e ação policial ao estilo James Bond, mas com mulheres. A saga originou nos anos 70 como seriado que ganhou filme em 2000, com sequência em 2003 de título “As Panteras Detonando”, com as atrizes Cameron Dias, Lucy Liu e Drew Barrymore nos papéis principais. Estas três maravilhosas foram grande referência para várias meninas e adolescentes da época – inclusive eu e a Cami – que não só temos os filmes como a trilha sonora.

Quão legal é ver mulheres em ação nos filmes, desvendando mistérios como detetives e fazendo justiça, com tudo isso associado a muito bom humor, roupas bacanas e tecnologias inimagináveis? Super legal! Ainda mais sendo algo que originou referência para a geração das nossas mães em uma época em que era mais difícil ainda ter uma representatividade deste porte, saindo do arquétipo de princesas e donas do lar. Mesmo com efeitos especiais um tanto improvisados, daqueles que você vê um brilho em torno dos atores mostrando que determinadas filmagens foram feitas em chroma key, é uma saga legal, divertida e aclamada.

Dando uma volta do tempo e relembrando um pouco do que são as Panteras, tirei um dia com a minha mãe, que acompanhou quando era criança, para debater e re-assistir a sobre a saga com os filmes de 2000 e 2003. As Panteras é um seriado original dos anos 70 produzido nos EUA com 5 temporadas. O seriado conta a histórico da Agência de investigação Townsend, sobrenome do investidor e fornecedor de tecnologia Charlie Townsend. A Agência tem uma espécie de gerente cujo cargo se chama Bosley e um trio de mulheres para fazer o papel de agentes investigativas vivendo sob identidades secretas.

Década de 70

A série que ganhou reboot com o filme em 2000 nos primeiros minutos satiriza o fato de ser inspirado em algo já existente com a personagem Dylan (Drew Barrymore) sob disfarce em um avião observando a programação. A TV exibe “T.J. Hooker: The Movie” que fala de “outro filme baseado em um seriado de TV antigo”, o que é uma ironia, já que o próprio filme segue a mesma linha, dando um tom cômico à personagem. O assunto em voga no filme de 2000 é uma mistura de engenharia de softwares identificadores de vozes, com satélites de posicionamento global para rastrear celulares como uma queda de privacidade. O que é um problema que, criado no início dos anos 2000, seria algo super possível atualmente, anos depois. No filme de 2003 o tema são três anéis que combinados codificam informações sigilosas de testemunhas do programa de proteção federal. Ambas com muito uso de internet e rede de dados, coisa que ninguém imaginava o quão comum seria anos depois. Assim como a tecnologia apresentada em que as panteras têm acesso a internet a partir de dispositivos na palma das mãos, muito antes da invenção dos tablets. O mesmo ocorre na década de 70 quando elas já possuíam celulares e era um tipo de objeto que ninguém imaginava existir e ser tão comum no futuro.

2000 – 2003
2000

Outro ponto interessante na trama, é que a escolha das panteras é baseada não só em suas habilidades, mas em seu ser “diferente” perante ao que a sociedade considera comum. Afirmações de auto estima para cada pantera também é trabalhado para que possam executar seu trabalho e terem confiança no potencial que têm como uma, e mais ainda com o trabalho em equipe e na amizade das três.

“Cada Pantera é única. São como diamantes: não se fabrica, se acha.”.

Kelly, em As Panteras Detonando, de 2003.

“Eu tenho algo que você nunca vai ter: amigas!”.

Natalie, em As Panteras Detonando, de 2003.

Claro que nem sempre é fácil se manter em pé, e como todas são humanas, às vezes se questionam sobre o estilo de vida que levam e se seu grande poder afeta suas relações externas. Mesmo estando no topo do mundo com acesso ilimitado a tecnologias e demais itens para assegurar conforto e bem estar. O que é outro ponto muito forte que a saga vem trazendo desde a década de 70 e firmando cada vez mais sobre dificuldades entre disputas de gênero não só no mercado de trabalho, mas em questões bem pessoais.

“Auto-estima é um conceito e uma crença com que muitas pessoas têm lutado, quer ou não se considerem a si mesmas como trabalhadores da luz ou não. Isso se tornou uma coisa muito “humana”, sentir falta de auto-estima, mesmo para aqueles que se consideram no topo do mundo no poder, conexões e abundância material.”.

Via site Semente das Estrelas.

Os dois filmes nos anos 2000 trazem essas preocupações em não serem honestas com seus parceiros sobre suas profissões, com a insegurança de serem rejeitadas pela fraqueza de alguns homens que não sabem lidar com mulheres fortes e não admitem ser o elo mais fraco. Conforme a trama vai avançando é legal ver que os “mocinhos” do filme são mente aberta quanto a isso, admiram e apoiam suas companheiras.

“Está difícil manter o disfarce e esconder a verdade de Jason. Quem que quer um homem que se intimide com mulheres fortes? Eles são super amorosos no começo, até saberem que quebro um tijolo com a testa.”.

Alex, em As Panteras, de 2000.

Com essas saudosas lembranças e reflexões, eu estava pronta para conferir o filme de 2019. Não sabia muito o que esperar e me questionei quando soube que haveria uma nova versão, 19 anos depois. Muitas coisas vêm à mente com determinado elenco, especialmente quando a obra é marcante para você e será refeita.

2019

O primeiro receio que aconteceu foi em relação a escolha de Kristen Stewart como uma das Panteras. Veríamos Bella Swan de Crepúsculo tentando ser uma mulher forte, mas cheia de dramas e uma única expressão facial? Para minha surpresa, não foi. É perceptível uma evolução no trabalho da atriz que dessa vez é engraçada, divertida e de personalidade rebelde ao interpretar Sabina Wilson. Ela demonstra uma postura firme e decidida com um discurso feminista interessante logo nos primeiros minutos de filme, que inclusive se passa no Brasil. Ela fala sobre o desejo tanto de homens quanto mulheres de querem realizar o seu potencial ao máximo, e quando essas questões de igualdade acontecerem, será esse o tipo de mundo em que ela quer viver. Além de outras conversas sobre possibilidades de escolhas baseada em gênero e sobre subestimar o valor e a força de alguém só por causa de um rostinho bonito, ou não, ignorando o que há por dentro.

Sabina

Ella Balinska, que interpreta a líder do time Jane Kano, foi uma boa surpresa. Não conhecia a atriz, que apesar de novata, penso que ela fez um bom trabalho interpretando bem as nuances de personalidades, casando bem com a história de sua personagem, que trabalha para o serviço secreto MI6, antes de ser recrutada para a Agência Townsend – Investigações Particulares. Naomi Scott e Elizabeth Banks são as melhores! Acredito que já havia química entre elas quando atuaram em conjunto em 2017 como, respectivamente, Kimberly Hart e Rita Repulsa, no novo filme de Power Rangers, o que provavelmente já as treinou e preparou para os papéis de ação.

Jane
Kimberly Hart – Rita Repulsa

Naomi interpreta Elena, uma cientista engenheira de softwares, que desenvolveu um sistema de energia sustentável chamado Calixto e percebe a necessidade de uma adequação no projeto para que não se torne uma ameaça para o planeta em vez de uma ajuda. Quando tenta reportar aos seus superiores a respeito é ignorada e não leva os créditos pela criação. Ela é assediada moralmente e como se sente insegura, não consegue revidar e reverter a situação. Além disso, o chefe, Dr. Fleming (Nate Faxon), nem sabe explicar direito o que Calixto é e como funciona, e além de roubar os créditos, ainda pretende vender para o mercado ilegal em Istambu. Zero preocupação com o planeta, mas apenas com o lucro e benefício próprio. Devido a isso, Elena decide denunciar às autoridades e a partir daí que seu envolvimento com a, até então, dupla de Panteras Sabina e Jane começa. É divertido ver que no começo a personagem se sente totalmente deslocada, mas que vai aprendendo na marra conforme as situações vão ocorrendo, como lidar com elas, até o momento em que é recrutada oficialmente para ser a terceira Pantera. Interessante mencionar ainda que há um momento de conversa entre as três em que cada uma expõem ao grupo sua própria vulnerabilidade. Ao exercer a empatia ouvindo uma a história da outra, seus laços se fortalecem e o trabalho em equipe funciona ainda melhor do que apenas por coleguismo e seriedade.

Elena

Elisabet Banks está girl power total! Além de produzir e dirigir um filme de mulheres para mulheres, ela interpreta a Bosley, o cargo de gerência da agência Townsend. Não só um cargo alto, mas sendo uma ex-Pantera promovida a Bosley. Substituindo John Bosley, interpretado pelo acalmado Patrik Stewart (Picad em Star Trek, Profº Xavier em X-Men) que representa a versão mais velha de Jon Bosley de Bill Murray (Caça Fantasmas, Garfield) dos filmes. Ou seja, As Panteras 2019 é uma continuação direta da saga que representa uma mesma linha temporal desde a década de 70, e parte das conexões com as produções passada é demonstrada de forma nostálgica por fotos, figurinos no closet e antigas Panteras fazendo uma participação especial como mentoras nos treinamento atuais.

Closet 2019

A história do personagem inicia com uma festa de despedida e aposentadoria depois de 40 anos em serviço. Muito legal que ele expandiu a agência globalmente criando várias sedes ao redor do mundo, e esta despedida conta com uma grande videoconferência com Bosleys ao redor do planeta, agradecendo pelo seu legado.

Há uma mudança de andamento do roteiro em mais de um plot twist envolvendo o personagem. Sendo ele uma versão mais velha do Bosley dos anos 2000, fica um pouco decepcionante o andamento que história dele toma, não parecendo ser a mesma pessoa. É triste acreditar que um personagem que sabe como a agência funciona, e dedicou 40 anos buscando mulheres em potencial para se tornarem Panteras, e pensando em um bem maior expandindo a agência mundo afora, queira algo a mais, alegando que deveria herdar a agência após a morte de Charlie. Que fatos e motivações teriam feito o personagem mudar? Me lembrou a famosa frase de Rousseau: “O Homem é bom, mas a sociedade o corrompe.”. Em sua festa de festa de despedida, temos a primeira aparição de Charlie no filme novo, em seu famoso rádio quadrado, cujo design é o mesmo dos anos 70 e sempre pareceu futurista. Ele dá as boas-vindas e palavras de agradecimento ao serviço prestado oferecendo um belo relógio de presente.

Patrick Steawart como Bosley – 2019

Ao se aposentar, a Bosley de Elizabeth Banks assume o cargo. Fica então interessante a dinâmica do filme com uma personagem feminina a mais em um cargo em que costumamos ver apenas figuras masculinas. O que nos leva mais uma conexão com James Bond, em que o cago de gerência, da agente “M”, se renova conforme as mudanças dos agentes 007, e que nas versões mais recentes com Daniel Craig, “M” é interpretado por uma mulher.

Elizabeth Banks como Bosley – 2019
Bill Murray como Bosley – 2000

Como esperado, o filme é recheado de cenas de ação, acrobacia e perseguição. Segue um padrão como estamos acostumados a ver, exceto por duas mudanças: uma delas é a que não há exploração de sensualidade do corpo das meninas, como em alguns ângulos de filmagem desnecessários nos filmes anteriores. O que é ótimo! Se os filmes anteriores já eram uma representação do empoderamento feminino, este é mais ainda por não ter nenhuma cena de objetificação do corpo feminino, junto a Banks no cargo de Bosley. E outra mudança, é que Charlie é quase que ausente em suas participações, logo o investidor e fornecedor de tecnologia da agência que leva seu sobrenome, Townsend, que nunca vemos, mas apenas ouvimos através da icônica caixinha de rádio com o famoso: “Bom dia, Panteras!”.

Década de 70
2000
2019

Charlie desta vez aparece poucos segundos como a silhueta do braço de uma mulher operando um decodificador de voz para a famosa caixinha de rádio da agência. A mesma foto dos filmes anteriores simbolizando seu período jovem no exército. Porém, fico a dúvida no ar: ele morreu ou é um ser eterno? Nos filmes vemos uma silhueta masculina falando ao telefone e nesse vemos traços femininos no computador utilizando o decodificador de voz. Mas seria Charlie ou um funcionário?

Charlie não é o que está de frente, mas o outro em que não vemos seu rosto

Charlie de fato nunca apareceu. Só se ouve a voz pelo radinho e de vez em nunca alguma silhueta. Na série, ao final de quase todo episódio, as Panteras tentam encontrar e ver Charlie, mas sempre se deparam apenas com o radinho. Como o filme é uma continuação direta da série, fica claro que a figura do chefe é do mesmo Charlie desde a década de 70, como se ele fosse um ser que o tempo todo estivesse em outro lugar, outra dimensão, mas em contato com o que está acontecendo na Terra. Esse conceito pode ser algo não imaginado no início da série, mas dá margem pra interpretação nos anos 2000 pela cena final do filme de 2000, observando a troca de cores simultâneas quando vemos uma silhueta ao pôr do sol falando no telefone com Bosley, Alex, Natalie e Dylan, simultaneamente, ao céu azul do meio-dia, e que me faz pensar que pode não ser tão absurda essa teoria. Além de que vemos vários Bosleys e atores ao decorrer das décadas, mas sempre o mesmo Charlie, que não só patrocina como antecipa e dá acesso a tecnologias inimagináveis, como se fossem coisas comuns em outros mundos e desconhecidas na Terra. Como se fosse a prévia de determinado artefato ou dispositivo naquela era, que seriam comuns anos depois, como os celulares, tablets e sistema avançado de internet. E para complementar, ainda falando da cena final de 2000, as meninas questionam como acreditar que Charlie existe mesmo se elas nunca o vêem, no que ele responde dizendo que é preciso ter fé, pois é um dos conceitos principais para acreditar que há algo a mais do que vivemos e vemos por aqui neste plano.

Caixa de rádio à esquerda
Charlie (!) (?)

Voltando ao filme de 2019, novas preocupações bastante atuais também aparecem na trama, além de busca de fonte de energia sustentável, como ONGs de apoio a mulheres solteiras desamparadas; repressão de “colarinho branco” que rouba dinheiro que é destinado a ajuda de mulheres e crianças; e a apresentação de um novo personagem de nome Santo. Esse é um personagem cujo cargo é ser responsável por cuidar da mente, alma e corpo das Panteras. Um treinador que as ajuda a manterem a forma, trabalhando também com culinária saudável e terapias holísticas. No primeiro encontro com Elena suas palavras são “Uau, você tem uma energia muito boa!”. Assuntos que reforçam a atual busca de uma vida saudável que vai muito além de malhar o corpo, mas também cuidar da mente e da alma, pois o funcionamento em equilíbrio destes três elementos no corpo, em especial de uma Pantera, é fundamental para o rendimento diário de cada um.

A volta da trama me faz pensar que de tempos em tempos é interessante resgatar As Panteras para se conectar com as gerações. Cada faixa etária tem o seu trio de Panteras de referência. Assim como a escolha de atrizes, a trilha sonora também reflete alguns artistas em alta de terminada época (desculpa galera de 2019, mas a trilha Pop-Rock de 2000 e 2003 é muito mais interessante do que o Pop em que um tema ou outro é legal e o restante que foi escolhido é um tanto quanto “o genérico de trilha sonora pop comercial”. Está “legalzinho” mas poderia ser melhor).

Pelo menos o tema clássico de “Charlie’s Angels: Theme Song, pela The Spelding’s Jazz Orchestra, está presente, e sempre estará! Mas o maior ponto em especial a ser refletido em cada geração são os temas apresentados para resolução dos casos, por sempre são algo relevante para época e às vezes até precursor de algo que ainda não temos, mas pode vir a ocorrer. Assim como as tecnologias utilizadas às vezes absurdas em uma era e tão comum anos depois.

E é claro, sempre bom sempre termos “anjos” entre nós para nos inspirar e nos salvar! Relembrando que a trama original em tradução livre significa “Anjos de Charlie” e só no Brasil que se tornou “As Panteras”. O que não deixa de ser interessante, pois o arquétipo da pantera na cultura xamânica significa valentia, ferocidade, sendo um símbolo de manifestação da força feminino. Conectado a significados a partir de uma imagem, houve uma mudança nesse filme quanto ao sistema de comunicação entre elas, que deixa de ser por implante dentário, sendo realizado agora por uma tatuagem. A ideia é que as asas abstradas representadas pela nova logomarca, sejam o símbolo de liberdade e voô, como se literalmente desse asas à pessoa tatuada para poder se comunicar com a sua equipe de forma quase que telepática.

Ainda sobre inspirar, há uma cena linda mostrando várias crianças, jovens meninas de várias idades e nacionalidades, como se fossem todas futuras Panteras em potencial.

“No universo xamânico o símbolo da Pantera é semelhante ao símbolo dos grandes felinos, um símbolo de ferocidade e valentia. Parecido com o tigre e o leão. Esse símbolo carrega a agressividade e o poder, mas sem o significado solar. No caso da Pantera sua ligação é com a lua e ela nos presenteia com enorme poder e energia do feminino. É um símbolo da manifestação dessa energia sobre a terra, significando a vida, o poder e a noite. Sua aparição nos adverte que despertou o nosso inconsciente.”.

Via site Flor de Lótus.

Para este trio de Panteras, de força feminina, damos um trio de cookies funcionais e veganos para repor as energias para partirem para a próxima missão!