Em um mundo repleto de maldade, ainda existem heróis.

O que define um herói?
É preciso voar, saltar por cima de arranha-céus, possuir visão de raio X ou força sobre humana?
É necessário ter arqui-inimigos, combater o crime, pertencer a um grupo ou ter dons especiais?

O Super-Homem é o verdadeiro exemplo de super-herói? Como bem escrito por Jeph Loeb e Tom Morris[1]:

“Esteja ele segurando um batedor de carteira, frustrando um dos planos malignos do Lex Luthor ou desviando um asteroide de seu curso de colisão contra a Terra, o Super-Homem dá-nos sempre um exemplo de compromisso com a verdade, com a justiça e não só com o jeito americano, mas o jeito verdadeiramente humano. Muitos outros super-heróis também nos mostram isso. Todos devemos nos empenhar em viver para o bem, não só nosso, mas das outras pessoas à nossa volta. Deveríamos nos preocupar com nossa comunidade e nosso mundo maior.”.

Mas na vida real, onde estão os nossos heróis? Quem são aqueles que lutam dia-a-dia para tentar tornar o mundo um lugar melhor?

Inspirado no artigo American Nightmare: The Ballad of Richard Jewell, da jornalista Marie Brenner, o filme “O Caso de Richard Jewell” retrata o ocorrido nos Jogos Olímpicos de Verão de 1996, em Atlanta, EUA, onde o Centennial Olympic Park foi palco de um ataque terrorista que resultou na morte de duas pessoas e em mais de uma centena de feridos.

O fato teria ocasionado um número muito maior de vítimas mortais se o simpático e carismático segurança do local Richard Jewell, belissimamente interpretado por Paul Walter Hauser, não tivesse descoberto o engenho explosivo e avisado os policiais antes da sua detonação.

Após tomar todas a medidas possíveis para alertar as autoridades e proteger os cidadãos, com a minimização dos efeitos da explosão, Richard Jewell foi imediatamente aclamado pela mídia como um herói, passando a dar entrevistas à jornais e redes de televisão durante três dias consecutivos.

Assim, foi amplamente divulgado que um simples segurança evitou a morte de dezenas de pessoas ao descobrir uma mochila repleta de explosivos próxima a um palco na Centennial Olympic Park, durante às Olimpíadas de Atlanta.

O roteiro de Billy Ray tem bons méritos ao construir ao longo dos anos e de forma dinâmica a figura absolutamente humana de Richard Jewell, ele é um homem honrado, bem-intencionado, bom filho, um típico patriota que coleciona armas e não paga impostos, detentor de uma personalidade forte e muito carismático.

Paul Walter Hauser é majestoso na representação do silencioso e peculiar estado emocional de Jewell, um cidadão simples e vulnerável ao poder do Estado, que tenta fazer o possível para melhorar a sociedade em que vive sempre disposto a ajudar as pessoas.

Contudo, o estado de graça de Richard Jewell viria a ser interrompido pelas notícias de que o FBI suspeitava do seu envolvimento no ataque terrorista alegando que este possuiria um possível perfil criminoso e que o atentado teria sido motivado pela sua ânsia em ser reconhecido por todos como um verdadeiro herói americano.

Embora sem nunca ter sido formalmente acusado ou detido pelo atentado à bomba no Centennial Olympic Park, Richard Jewell tem sua vida completamente devastada pela atitude autoritária do FBI, que passam a lhe perseguir, intimidar e a violar a intimidade de sua família, coagindo-o moralmente com o intuito de lhe imputar falsas provas para lhe considerar o culpado pelo crime.

Além disso, como se não bastasse todas as desgraças ocasionadas pela brutal violação aos seus direitos e o abalo psicológico gerado pela atitude do FBI, a mídia rapidamente lhe transformou de herói à vilão, publicando manchetes negativas a seu respeito, criticando sua devoção ao governo, à corporação policial e ao bem-estar da sociedade.

O filme também retrata o árduo trabalho do advogado Watson Bryant, vivido por Sam Rockwell, que faz de tudo para provar a inocência de Richard Jewell, além de tentar convencê-lo de que nem todos os policiais e agentes do governo são seus amigos ou desejam o bem-estar da sociedade, como ele inocentemente considera.

O longa traz a reflexão problemas estruturais da atual sociedade americana, a antiética do jornalismo sensacionalista e o punitivismo de um sistema policial que enxerga pessoas como números e não como seres humanos.

O importante não é melhorar a sociedade, mas sim é achar um culpado, tudo em nome de resultados.

A verdade é que a vida de Richard Jewell nunca mais foi a mesma desde que foi acusado por algo que não fez e, que tentou ao máximo evitar.

Richard Jewell não quis ser um herói, ele apenas fez o que que deveria e agiu pensando no próximo. Contudo, pagou um preço muito caro por isso. Talvez este, seja o verdadeiro significado em ser um herói. Assim, o filme conquista 5 cookies indevidamente injustiçados pela catraca do sistema!

O filme estreia no Brasil em 02/01/2020.


REFERÊNCIA:
[1] MORRIS, Tom; MORRIS, Matt. Super-heróis e a filosofia: verdade, justiça e o caminho socrático. São Paulo: Madras, 2009. P. 29-30.