Um filme independente protagonizado por Natalie Portman e Jude Law, com a narração do Willem Dafoe e canções originais da Sia. Havia tudo para ser um espetáculo na tela do cinema, e o produto final é incrível mesmo! Com atuações brilhantes e um roteiro denso, Vox Lux pinta o cenário atual do século XXI, mostrando todas suas nuanças e proporcionando um questionamento: é possível viver além desse circo que criamos?

Temos em mãos uma narrativa de dois filmes, que se completam e se misturam de formas sutis e encantadoras. O roteirista e diretor Brady Corbet faz uma escolha ousada, mas que é muito bem sucedida: até a metade do filme, a atriz Raffey Cassidy interpreta a jovem Celeste, uma garota que após um grande trauma possui a oportunidade de atuar dentro da indústria musical. É apenas depois de quase uma hora de filme que a personagem se transforma na “Diva Pop” impactante interpretada por Portman. Nesse momento, Cassidy assume a forma de Albertine, filha de Celeste, que tenta se encontrar dentro do cenário frenético que é a vida da sua mãe.

Na primeira parte da obra, testemunhamos alguns anos da vida de Celeste e sua irmã Ellie (Stacy Martin), quando, aos poucos, foram ganhando espaço na atenção do público – e se afastando de si mesmas. Toda essa bagagem culmina no dia de estreia do tour do novo álbum de Celeste: Vox Lux. Nessa segunda parte, temos um ritmo mais acelerado ao acompanhar o dia da protagonista e observar como suas relações se modificaram ao longo dos anos. As personagens de Jude Law e Jennifer Ehle, o agente e a publicista da cantora, são as pontes da narrativa que agem como constantes em um mundo que se demonstra cada vez mais caótico. 

Com Portman no comando de Celeste, temos uma celebridade inteligente amplamente afetada pelas pressões que seu ambiente de trabalho exerce. Ela vê deslumbres do que sua vida já foi e possui momentos de claridade do que poderia viver fora da realidade cunhada em um paradigma antigo de competição e de se manter relevante para conseguir pagar as contas. Mas esses são apenas segundos, algumas poucas palavras, antes da aleatoriedade sem sentido daquilo do que se acha que deve ser feito caia completamente em sua cabeça. 

Nós vivemos em um circo criado por nós mesmo. Todo mundo está gritando de suas próprias maneiras por algo que faça sentido. Antes, a vida nunca era boa devido a alguma falta exterior. Períodos de guerras, grande depressão, opressão de ideais, epidemias. Hoje, pelo menos parte da população vive em um ambiente em que nada realmente falta. Temos acesso a tudo que precisamos. No entanto, não somos felizes. Entramos em cotidianos tóxicos e destrutivos achando que é a melhor solução palpável.

“O diabo que conhecemos”, não é aquele do provérbio? Falando do diabo, ele é visto sob olhos ruins, mas é quem faz o trabalho de trazer à consciência os aspectos considerados “sujos” de nós mesmos. Não como punição, como muitos compreendem, mas como oportunidade de limpeza e mudança. Quando é dito no filme que o diabo teria feito um acordo para gerar grandes mudanças, faz sentido. Muitos olham para o cenário da nossa modernidade e o julgam malévolo. Com tantas atrocidades, tanta injustiça, tanto sofrimento.

Mas, quem sabe, esse seja o cenário perfeito para olharmos o que construímos e gerarmos as mudanças que queremos. Quem sabe seja a forma que concebemos para a mudança. O mundo nunca teve tantas pessoas saudáveis, um número tão pequeno de mortes, um acesso tão amplo a conteúdos e produtos mundiais. E estamos infelizes. Procurado formas diárias de fuga da realidade.

Eu acho que todo mundo deveria ficar rico, famoso e fazer tudo o que sempre sonharam, para que possam ver que essa não é a resposta”, já diria Jim Carrey. 

A resposta não está lá, no exterior. Ela nunca esteve. Ela sempre esteve perto, esperando ser acessada. O caminho até ela é mais doloroso que viver sob as pressões do exterior, e por isso muitos o evitam. Mas quando se começa a colher os frutos dessa jornada, fica claro o quanto vale a pena olha para dentro, para si mesmo. Se afastar do palco dos outros, e se concentrar apenas no seu.

Vox Lux é uma produção que vale a pena conferir. O roteiro, o cenário, o figurino, as atuações – tudo muito bem pensado e executado. Em Curitiba, o filme está em exibição no Cine Passeio.

Por tamanha carga filosófica, o filme ganha nota máxima: 5 cookies!