O que é a realidade? Esta vida é minha? Estou sonhando ou estou acordado? O que está acontecendo? Não me sinto pertencente de onde estou, então… existem outras realidades? Para onde isso vai me levar?

Estes e outros questionamentos com certeza passam pela cabeça do expectador ao assistir um dos filmes da saga Matrix. O primeiro filme da trilogia estreou em 1999 pelo olhar dos irmãos (hoje irmãs) Wachowski, e revolucionou a história do cinema. O impacto cinematográfico, especialmente em filmes de ação, foi tão grande que o contrato com a Warner Bros. de 3 filmes, sendo o primeiro com orçamento não tão alto, gerou 3 vezes mais investimentos aos longas de sequência Matrix Reloaded e Matrix Revolutions, além da Warner Bros. dar total liberdade criativa aos diretores.

Matrix 4 e Matrix 1

A produção foi tão disruptiva em todos os aspectos que no começo ninguém, além dos diretores, entendia muito bem a trama do filme. A primeira lida do roteiro fez a própria produção (além de se encantar) questionar o que era realidade ou não.

Os diretores tinham muitas referências e background com quadrinhos, mangás, filosofia, realidade da vida, clássicos já escritos que falavam de robôs, de fim do mundo, de realidades paralelas, etc. Logo, o storyboard dos diretores foi realmente necessário para a explicação visual do roteiro para a produção. Foi usado no filme tudo que a produção sabia sobre tudo até aquele momento! Tudo em questão de tecnologia, filmagem, filosofia, sociologia, debates humanitários, referências de scifi, livros, absolutamente tudo mesmo!

Keanu Reeves inclusive teve que ler alguns livros antes de estudar o roteiro, como  “Evolutionary Psychology” e “Out of Control”. Os livros falam de evolução dos robôs, sistemas e sociedade.

Matrix traz o protagonista Thomas Anderson que desperta da Matrix procurando algo a mais. Ele se sente deslocado, não pertencente e que há “algo além do véu”. Ao longo do percurso ele segue o coelho branco, em referência a Alice no País das Maravilhas, encontra Morpheus, Trinity e acompanhamos momentos de reflexões profundas por trás de metáforas e ações.

“Já teve a sensação de não saber se está acordado ou ainda sonhando?”

>> Matrix | Thomas Anderson

Dentre simulação de realidade, poder, controle, ilusão e muitos questionamentos, é possível afirmar que é difícil ter total compreensão do filme assistindo apenas uma vez. O entendimento do todo também é proporcional ao entendimento de cada um sobre a vida e seu estado atual de evolução pessoal. É aquele tipo de obra que cada vez que você reassiste, quanto mais velho você fica, mais você passa a compreender a profundidade deste universo. E o mesmo pode ser dito desta sequência, 22 anos depois. Com certeza fará ainda mais sentido na segunda, terceira, quarta vez…

“Liberte sua mente.”

>> Matrix | Morpheus

O anúncio do novo filme, Matrix Resurrections tantos anos depois, gerou muita curiosidade, dúvidas e expectativas. A história não tinha encerrado? Como que a produção faria para nos surpreender como da primeira vez?

Pois bem, após os primeiros momentos de filme com MUITA referência ao primeiro, e uma sequência de acontecimentos, metalinguagem, quebra da quarta parede em conexão com o expectador, somos surpreendidos admirando o quão a obra conversa com a atualidade e nos faz ter as mesmas perguntas.

“Você está voltando para onde tudo começou. De volta à Matrix.”

Matrix Resurrections
Matrix Resurrections

Nos sentimos como o próprio Neo, hoje mais velho (mas nem tanto porque é o Keanu Reeves) em uma realidade atual, com certas memórias antigas, e nos perguntando o que está acontecendo e tentando entender onde tudo isso vai nos levar.

Neo: “Estou louco.”
Terapeuta: “Não usamos essa palavra aqui.”

Matrix Resurrections

Thomas Anderson, o Neo quando dentro da Matrix, sem memórias claras de tudo que ocorreu até aquele momento (entenda-se como Matrix 1, 2 e 3), nesta vida é um designer de games sendo incentivado a tomar a pílula azul, embaralhando ainda sobre o que é realidade ou não dentro da cabeça dele. Perguntando-se se o jogo multipremiado dele, chamado “Matrix”, licenciado pela Warner Bros., é só um jogo ou algo que ele já viveu. Olha a complexidade e mistura de metalinguagem e quebra da quarta parede.

Como em todo um processo de despertar, ele passa a estranhar sua vida e perceber um padrão repetitivo estranho em sua rotina. Após um modal, uma simulação para melhorar um programa, um “bug no sistema”, as coisas começam a acontecer. O encontro com a pessoa que será o coelho branco a seguir pelo desconhecido, Morpheus que irá ajudá-lo a sair do automático e claro, Trinity. Todas são as situações que o levam a perceber a linha tênue entre o manter-se no padrão de repetição e o acordar da Matrix para a realidade, se desligando dos controles mentais daqueles que o aprisionaram novamente em um mundo de ilusões.

Além das referências a Alice que a saga traz, o que acho extremamente interessante em Matrix, como é trabalhada a mente. Em tempos em que Inteligência Emocional está sendo olhada com mais cuidado e vista como tão ou mais importante que skills tecnológicos, sabemos que desbloquear a mente não é fácil. Em meio a dualidades de escolha, quantas influências externas, programações e padrões de pensamentos carregamos que nos levam a agir de determinada forma, e quanto isso afeta nossa saúde e vida como um todo. O quanto nossas escolhas e buscas impactam no que vai nos tirar da Matrix ou nos manter num estado suscetível a manipulações e sofrimento.

O livro Alice Através do Espelho, de Lewis Carroll, referenciado em Matrix Resurrections.

“A escolha é uma ilusão, você já sabe o que quer fazer, qual a resposta.”

Matrix Resurrections

E os sentimentos? Onde entram? Também fazem parte do assunto inteligência emocional.

Neo e Trinity claramente são almas gêmeas, e suas missões de vida tem o caminho cruzado. O primeiro toque entre Neo e Trinity dentro da Matrix, e a sensação de que já se conhecem, mesmo quando a memória ainda não é clara, traduz uma conexão além de manipulações e programação. Neo dizia que nem ele acreditava tanto nele, como Trinity e a profecia da Oráculo, que alegavam que ele era o escolhido que ajudaria a mudar o curso da história. Mas Trinity era a que mais acreditava. E desta vez foi ao contrário, ele precisou fazer Trinity acreditar nela mesma ajudando-a a se lembrar. Neo não era e não é o escolhido, e sim os dois são. Um enaltece o outro, um segura o outro quando o outro não está bem. Ambos têm o poder e juntos eles potencializam esta luz e a ação. Juntos a força deles é inabalável. Assim como quando duas almas gêmeas se encontram em que a luz que que eles potencializam e o movimento que ocorrer em torno deles é mil vezes maior do que quando estão sozinhos.

É interessante também mencionar o fato de agora algumas máquinas trabalharem ao lado dos humanos. Traduz a nossa realidade, e traz de volta o questionamento da dualidade. Maquinas podem ajudar, ou atrapalhar? São ferramentas que ajudam nos sonhos e realizações ou vilões que transformam ideias e sonhos em armas? Vai do estado de consciência de quem tem a chave para direcionar isso.

Ao assistir aos filmes e analisar como a Matrix se encaixa em nosso mundo real, vejo a Matrix como um estado de consciência. Estar fora da Matrix é olhar este estado de viver com outras perspectivas. Pensando e agindo por si, e não no automático programado, manipulado. São questionamentos sobre como saber se você quer algo ou se você foi programado para querer aquilo. É quando começamos a perceber momentos em que sentimos falta de um propósito, quando fugimos de uma mesma rotina, é viver para você e não para o que esperam que você seja ou a quem precise agradar. É transmutar sofrimento em lição e saber que nós sempre temos algo a aprender.

“Sei o suficiente para dizer que não sei de nada.”

>> Niobe

O sistema quer te manter de olhos fechados, quer que você engula a pílula azul e que você ache que a tua própria percepção não é a certa, é uma invenção e não uma outra perspectiva.

Matrix pode ser discutido, debatido, apreciado por diversos aspectos: pela parte filosófica, budista, pelo viés da tecnologia, efeitos especiais, figurino, fotografia, político, inovação cinematográfica, emocional e sentimental, pelo roteiro disruptivo… ou seja, há muitas vertentes dentro de uma única saga. Matrix, de fato, mexe com a nossa cabeça.

Eu vejo que além de todos estes vieses, é muito mais dos que máquinas e tecnologias, programações e escolhas, é também sobre amor. Feito para os fãs e para os buscadores incansáveis.

Nem toda mente está pronta para ser libertada. Porém como o Neo, nós, quando despertamos, estamos sempre na busca de algo. Na busca de um propósito, de um sentido, de alguém, de algo a mais. E você? Em qual busca você está? Como você se vê dentro da sua realidade?

Matrix Ressurections estreia hoje e leva 5 cookies e um Latte Caramel da cafeteria Simulatte! Liberte sua mente, escolha a pílula vermelha, saia da Matrix, questione a sua realidade, alinhe sua mente e coração como um todo, pense e sinta por si próprio.

A escolha é sua!

(Obs: tem cena pós-crédito)