Em A Pequena Travessa, logo no começo do filme somos apresentados a jovem protagonista Lilli Susewind (Liliane, na versão dublada), uma menina com uma habilidade peculiar, a capacidade de se comunicar com animais, no melhor estilo do filme Dr. Dolittle, de 1998, interpretado pelo renomado ator Eddie Murphy.

Porém, fora de seu círculo familiar, ninguém sabe deste segredo e sua comunicação com a fauna local acaba sempre lhe rendendo grandes confusões, o que inviabiliza a permanência da família na mesma cidade por muito tempo.

A ambientação mistura lugarejos e cenários de uma Europa interiorana, com casas que lembram o estilo clássico alemão e carros da década de 50 ou 60, em contraposição com novas tecnologias como celulares.

Logo na sequência inicial, por conta de uma confusão envolvendo a jovem Liliane, um burro que acredita ser um unicórnio e a inauguração de um monumento público, o Prefeito da cidadezinha é exposto publicamente ao ridículo, o que faz com a que a mãe da protagonista perca o emprego como repórter por conta da traquinagem da filha.

É de se destacar que a participação do burro é tão insólita que chega a destoar do ambiente pueril do filme (o animal literalmente defeca no rosto do Prefeito), o que torna a cena algo completamente grotesco e destoante das demais. Após tal inacreditável situação, novamente a família de Liliane se vê obrigada a mudar de cidade a fim de recomeçar a vida em um novo ambiente.

Nesta nova cidade, a protagonista tenta se adequar a rotina escolar, momento em que são apresentados outros personagens da trama como, Jess (Aaron Kissiov), um menino misterioso que logo nas primeira cenas descobre o grande segredo de Liliane, e três meninas que tentam emular o estilo de Regina George e suas seguidoras no filme Meninas Malvadas, de 2004.

A situação é um plagio tão caricato que até os trejeitos da personagem Regina George aparecem no filme, como quando a jovem Trixi (Felice Ahrens) líder do grupinho de meninas, tenta apelidar a protagonista com um diminutivo de seu nome ou quando estas tentam realizar uma dança em grupo durante uma festa de aniversário, no melhor estereótipo “patricinhas egoístas”.

A trama do filme se desenvolve quando os alunos da escola recebem a missão, como uma lição de casa, de ajudar na reinauguração do zoológico local. Chegando no zoológico, a protagonista descobre que os animais estão sumindo misteriosamente e, após o desaparecimento do bebê elefante Ronni, Liliane, juntamente com seus amigos, começam a tentar descobrir quem os está roubando.

Em meio a simplória trama, pode-se dizer que o filme tenta resgatar a pureza que só é encontrada na alma das crianças, especialmente quando estas se propõem a ajudar a regatar os animais do zoológico. Tal objetivo pode até conquistar o público infantil, mas certamente limitará demais o alcance do filme a outros espectadores, pois o ar fantasioso e caricato deixa claro que tudo ficará bem no final.

As poucas ou quase inexistentes explicações limitam qualquer questionamento sobre as motivações dos personagens, os conflitos da personagem principal não dão base para um maior aprofundamento, não há nenhuma explicação para o fato da protagonista falar com animais, a rapidez dos acontecimentos não dá espaço para deixar a trama fluída, ocorrem diversos erros de continuidade no figurino do elenco, os momentos da protagonista com os pais, que poderiam ser justamente um ponto de interesse, não fogem do estilo caricaturesco e estereotipado, como por exemplo, o pai ser absurdamente distraído e alienado, enquanto a mãe faz o estilo responsável e preocupada com a profissão.

O roteiro costura momentos de pouca força dramática, flertando incessantemente com o esquematismo como na sedativa relação da protagonista com o garoto Jess, sua rixa com as colegas “patricinhas”, na existência de uma previsível vilã e seu comparsa, na união de alunos “desajustados”, na utilização de animais criados com efeitos visuais de qualidade, no mínimo, questionável, etc.

Em meu ver, seria forçoso tentar encontrar maiores lições ou indagações mais profundas no roteiro, como questões sobre aceitação, individualização, liberdade de expressão, direito dos animais, “vegetarianismo”, etc.

Há até uma certa graciosidade na forma como é construído ludicamente o filme, contudo, as ideias funcionam de modo superficial, servindo apenas como uma diversão imediata que acabará sem muitas delongas em uma verdadeira fragilidade do conjunto. Por isso damos à Pequena Travessa apenas 2 cookies.