“Todo mundo quer um final feliz, não é? Mas nem sempre é assim. Talvez desta vez. Espero que, se estiver ouvindo esta gravação, que seja numa celebração. Espero que famílias estejam reunidas, espero que tenhamos nos recuperado, que uma versão normal do planeta tenha sido restaurada, se é que existe tal coisa. Meu Deus, que mundo! Que universo, agora! Se me dissessem há dez anos atrás que não estávamos sozinhos, muito menos nessa extensão… É, eu teria ficado surpreso… Mas quem imaginaria isso?”

Tony Stark – Vingadores Ultimato

Após ter visto, revisto e revisto novamente Vingadores: Ultimato e absorvido a inundação de sensações que o filme traz, resolvi refletir um pouco sobre o porquê de essa obra ter conseguido ocupar um lugar tão especial nos corações de milhares e milhares de pessoas espalhadas pelo mundo que o assistiram. É evidente que a narrativa tange para o sentimental desde seu início, e assim se mantém até o epílogo, atingindo o público com altas doses de emoção que são recebidas por cada um conforme a sua própria experiência anterior com aqueles personagens que acompanhamos ao longo de 11 anos no cinema, ou muito mais tempo do que isso, na TV ou nos quadrinhos.

Aquelas 3 horas de projeção me fizeram voltar no tempo… de volta à minha infância…

Eu tinha 10 anos quando, no consultório odontológico, enquanto aguardava para ser atendido, folheava as páginas de várias revistas que na mesinha da recepção se encontravam. Entre os adoráveis gibis da Turma da Mônica, havia também alguns de super-heróis. Um deles me chamou mais a atenção: Grandes Heróis Marvel nº 16, formatinho da Editora Abril trazendo na capa o Surfista Prateado e o Thor. Ainda bem que demorou pra eu ser chamado pra consulta, pois deu tempo de ler a primeira história completa. Um belíssimo confronto entre esses dois personagens, escrito pelo mestre Stan Lee e magistralmente ilustrado por John Buscema. E, mesmo que não tivesse dado tempo, semana que vem eu voltaria. Voltei, e foi a vez de folhear Super-Homem nº 36, lançada naquele mesmo mês de junho de 1987, e a história que me prendeu desta vez foi a que trazia nada menos do que a MORTE DO FLASH em plena Crise Nas Infinitas Terras… obviamente eu não entendi nada do contexto maior daquela saga, mas percebi se tratar de algo especial, monumental, épico!

Os anos foram se passando, e eu sempre lendo um gibi aqui, outro ali, conhecendo um pouco mais daqueles extraordinários personagens que eu também via na TV, no desenho animado da Liga da Justiça ou nos desenhos “inanimados” do Capitão América, Homem de Ferro, Hulk, Thor. Eis que, em maio de 1989, por influência de um colega colecionador, resolvi também começar a acompanhar mais de perto as histórias daqueles seres fantásticos e comprei oficialmente minha primeira revista em quadrinhos de super-heróis, Homem-Aranha nº 71, que marcava o início da fase do aracnídeo com o uniforme negro, após ter participado das Guerras Secretas.

Meu interesse pelo desenrolar das tramas, somado à curiosidade em querer saber como os personagens foram parar ali, me fizeram, então, comprar não só os lançamentos das bancas, como também gibis de meses, e até de anos anteriores, em tardes inteiras de adoráveis garimpos em sebos. Quase posso sentir aquele tão agradável aroma de papel usado que permeava esses locais. Entre as histórias que eu havia “perdido”, estavam as duas sagas acima citadas que, após terem sido lidas, ficaram devidamente esclarecidas em minha mente maravilhada. Os anos 90 chegaram e, com eles, a “mutanatização” da Marvel: Massacre dos Mutantes, Queda dos Mutantes, Inferno, A Era do Apocalipse… Também aconteceram outros eventos de impacto global, intergaláctico, universal: Guerras Secretas II, Atos de Vingança, Desafio Infinito, Guerra Infinita, Cruzada Infinita… e entre tantas compilações de fabulosas epopeias de anos atrás, tive o privilegio de conhecer a Saga da Fênix Negra e… A Saga de Thanos!

Foram cerca de 10 anos colecionando histórias em quadrinhos (HQs), comprando, eventualmente, revistas da DC e, regularmente, da Marvel, cujos personagens eu considerava mais “próximos”, pois eu me preocupava com Peter Parker sem dinheiro para pagar o aluguel de seu apê, ou com os dilemas existenciais de Bruce Banner, os conflitos familiares do Quarteto Fantástico, os alunos do Professor Xavier, além de enfrentar vilões, tendo que lidar com o preconceito da sociedade, e as missões terrestres, espaciais e temporais dos Vingadores que, por mais que fossem grandiosas, valorizavam os problemas pessoais de cada um de seus integrantes.

Durante todo esse período de consumo de quadrinhos Marvel/DC, como eu e meus amigos marvetes/decenautas viajávamos!!! Nossas mentes transcendiam a realidade com aquelas fantásticas histórias, permeadas por personagens tão cativantes que tanto admirávamos, como o Demolidor em A Queda de Murdock, ou Wolverine no Japão tentando ser feliz com Mariko. Comentávamos muito o quanto várias daquelas obras de papel tinham potencial, tanto visual quanto narrativo, para serem transpostas para as telas do cinema e, com isso, alcançarem um público maior. Então, ficamos estupefatos quando fomos assistir, em 1991, O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final, de James Cameron, e percebemos o quanto a trama daquele blockbuster possuía semelhanças com a da história em quadrinhos dos X-Men lançada em 1981: Dias de Um Futuro Esquecido, de Chris Claremont e John Byrne. Mesmo assim, ver nossos super-heróis favoritos invadindo as telonas de maneira digna ainda era para nós, naquela época, apenas um sonho, um sonho muito distante. Mal sabíamos que, vinte e três anos depois, salas de cinema do mundo inteiro exibiriam, com sucesso, o quinto filme protagonizado pelos X-Men, batizado com o mesmo título daquela clássica HQ, e adaptando, dignamente, sua trama, mas esta é uma outra história.

Então, a idade adulta foi chegando e, com ela, a falta de tempo para me dedicar às HQs tanto quanto outrora, somada às prioridades da vida, que acabam por minar, mesmo que inconscientemente, alguns dos interesses da infância e da adolescência. Com isso, na entrada dos anos 2000, a leitura de quadrinhos passou a ser apenas esporádica para mim, embora a paixão pela nona arte permaneça a mesma até hoje.

Eis que, nas últimas décadas, temos acompanhado o surgimento, a evolução e a consolidação do gênero “filmes de super-heróis”, cujo pontapé inicial foi dado com Blade, lançado em 1998, que abriu as portas para os X-Men em 2000, que abriu as portas para o Homem-Aranha em 2002, que escancarou as portas para muitos outros até a chegada, em 2008, de uma produção (vejam só a ironia) independente, chamada… Homem de Ferro. Onze anos depois, presenciamos a Marvel Studios fazendo parte do poderosíssimo conglomerado Disney e tendo se tornado um nome respeitadíssimo na indústria cinematográfica. Sua credibilidade foi sendo conquistada ao longo de todo esse período, sob a tutela do gênio Kevin Feige, que construiu cuidadosamente seus personagens, colocando nas tramas pistas do que estava por vir e implementando estrategicamente cenas pós-créditos em cada longa, simulando, com isso, a continuidade dos gibis que sempre “prendem” o leitor para a edição do mês seguinte, e enfim, erguendo os pilares de algo que ainda não sabíamos o que era, mas que se revelou ser um detalhado universo compartilhado, onde super-heróis de filmes diferentes coexistem e, mais do que isso, interagem! A emoção que senti ao ver Os Vingadores no cinema, em 2012, é muito similar à daquele menino de 10 anos que, no consultório odontológico, se maravilhou com o Thor e o Surfista juntos no mesmo gibi. 

Que cena minha gente!!!!

O ano é 2019, e é lançado Vingadores: Ultimato, fechando de forma não menos do que épica a “Saga de Thanos” no cinema, para delírio não apenas dos fãs raízes, mas também de famílias inteiras que hoje passeiam pelos shoppings usando camisetas de seus super-heróis favoritos. A frase: “O mundo não é mais o mesmo”, ouvida em tantos trailers hoje em dia, reflete a mais pura realidade, pois hoje vivemos em um mundo onde super-heróis não são mais “coisa de criança”, histórias em quadrinhos não são mais um nicho de mercado, e assistir filmes com esses personagens não são mais motivo para vergonha alheia. Sim, para quem viveu a infância nos anos 80, demorou um pouco, é verdade, mas, além dos clássicos Superman com Christopher Reeve e Batman de Tim Burton, outros super-heróis invadiram as telas com dignidade, a partir dos anos 2000, culminando no extraordinário e apoteótico evento que foi este filme de fechamento de 11 anos de MCU! Portanto, plateias do mundo inteiro viram e se emocionaram exaustivamente com este longa conclusivo, cada expectador à sua maneira, cada um com a sua própria experiência de vida e a sua relação com esses personagens, sua memória afetiva e seu nível de envolvimento pessoal com o que era mostrado na telona. Entre tantos momentos marcantes ao longo de suas 3 horas de duração, que passaram voando, ficaram na memória e no coração:

  • A família inteira de Clint Barton sendo evaporada pelo estalar de dedos do Thanos, antes mesmo de surgir na tela o magnânimo logotipo da Marvel Studios;
  • Thanos sendo derrotado ainda no início do filme para, em seguida, sermos impactados com a dramática elipse situada pela frase: CINCO ANOS DEPOIS, mostrando os Vingadores que sobraram, desiludidos, lidando como podiam com suas perdas;
  • Tony Stark, em sua casa de campo, brincando com sua filhinha que, antes de dormir, diz pra ele: “Te amo três mil!”;
  • Na viagem no tempo para recuperarem as Jóias do Infinito, Thor reencontrando sua mãe; Stark reencontrando seu pai; e Steve Rogers revendo, de relance, Peggy Carter, sua amada, com quem tinha um encontro, interrompido durante a Segunda Guerra Mundial;
  • Clint e Natasha lutando em Vormir, literalmente, até a morte, porém, um tentando salvar a vida do outro, sacrificando, com isso, a própria vida, até Nat “vencer” a batalha;
  • Scott Lang olhando, pela janela do QG dos Vingadores, os pássaros cantando, sugerindo que a missão para trazer todos de volta deu certo, só para, segundos depois, o local ser violentamente bombardeado e destruído pela nave de Thanos;
  • Rogers empunhando o martelo encantado de Thor, o lendário Mjölnir, e indo pra cima do Thanos;
Que MOMENTO senhoras e senhores!!!!
  • Rogers caído, sangrando, cansado, mas não derrotado, se levantando, afivelando ainda mais apertado no braço o seu escudo quebrado e encarando, sozinho, o exército de Thanos quando, de repente, ouve uma voz que diz: “À sua esquerda!”;
Palpitações no coração nesta cena!
  • Sam Wilson, T’Challa, Peter Parker e todos os outros heróis que haviam morrido no estalo, reaparecendo nos portais abertos pelo Dr. Stephen Strange e formando o exército dos Vingadores;
  • Rogers dizendo: “VINGADORES… AVANTE!”;
  • A mais épica sequência de batalha já vista até hoje em um filme de super-heróis;
  • Pepper Potts surgindo durante a batalha… com sua armadura de ferro;
  • Stark reencontrando seu pupilo, Parker;
  • Após a entrada triunfal de Carol Danvers, destruindo sozinha o “cruzador imperial” de Thanos; o momento girl power, com ela e todas as demais heroínas reunidas, dando cobertura à Parker que, por sua vez, protegia a manopla;
  • Stark, com as Jóias do Infinito na luva de sua armadura, ouvindo Thanos dizer: “Eu sou inevitável”, para depois responder: “E eu… sou… o Homem de Ferro!”, e estalar os dedos;
  • Rogers e todos os demais, ainda no cenário da batalha, chorando pela morte de Stark;
  • A gravação de Stark, que começa com as palavras lidas no primeiro paragrafo deste texto, que continua com:

“As forças épicas das trevas e da luz que se revelaram, e para o bem ou para o mal, essa é a realidade em que a Morgan terá que encontrar uma maneira de crescer. Então, eu pensei que provavelmente seria melhor gravar uma pequena mensagem no caso de uma morte inoportuna, da minha parte. Quer dizer, não que a morte possa ser oportuna. Essa viagem no tempo que vamos tentar fazer amanhã, me fez queimar a cabeça sobre a viabilidade de tudo isso… Essa é a razão. É isso que faz um herói, não é?”

Tony Stark – Vingadores Ultimato
  • No funeral de Stark, a família Barton e a “família Formiga”, entre tantos outros núcleos, reunidos novamente;
  • Rogers, velhinho, após ter voltado para sua época e vivido décadas de felicidade ao lado do amor de sua vida, reaparecendo no mesmo cenário onde voltou no tempo, para entregar o escudo a Sam que, relutantemente, aceita a missão de ser o novo Capitão América, recebendo, também, a aprovação de Bucky;
  • Steve Rogers e Peggy Carter, finalmente, dançando. FIM.
Se você ainda não chorou até aqui, este é o momento! <3

MEU DEUS, QUE OBRA-PRIMA!

Esta, portanto, foi a minha particular experiência cinematográfica com Vingadores: Ultimato, fechamento de uma saga, levemente inspirada pelas HQs, extremamente complexa em seus inúmeros detalhes, com alguns furos de roteiro, sim, mas levada ao cinema com um nível ímpar de qualidade. Aquele sonho distante se tornou realidade! Se me dissessem há 30 anos atrás que um filme assim seria lançado, e com tanta grandiosidade, eu teria ficado surpreso… Mas quem imaginaria isso? Que os super-heróis alcançariam um sucesso nessa extensão? Sendo eu um apaixonado por HQs de super-heróis, me senti plenamente realizado, e levando em conta outras obras igualmente merecedoras de admiração, não hesito em afirmar ser, na minha humilde opinião, Vingadores: Ultimato, de longe, o maior filme de super-heróis de todos os tempos… pelo menos, até agora. Muitos também notaram certas semelhanças e traçaram um paralelo desta obra, com todo o seu esplendor gráfico e narrativo, com outra igualmente magnifica, O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei, pois, após aquele sensacional desfecho em Mordor, também há um longo e comovente epílogo, no qual nos despedimos daqueles personagens com lágrimas nos olhos. E o último frame antes dos créditos finais focaliza uma imagem simples e intimista, a porta da casa de Bilbo. Semelhantemente, a última cena do último Harry Potter e as Relíqueas da Morte – Parte 2 mostra, em plano fechado, o trio de protagonistas, já adultos. E não haveria imagem melhor para fechar a Saga do Infinito do que o beijo de Steve e Peggy. Grandes epopeias com desfechos completamente intimistas e emotivos. Momentos que fazem parte da história do cinema, do qual, por sua vez, fazem parte… os super-heróis que amamos há tantos anos.

E nada melhor que conferir esta obra prima ao lado dos amigos!

A resposta, portanto, à pergunta: “Por que Vingadores: Ultimato mexeu tanto com a gente?” é fácil. Porque, além de ser um dos maiores blockbusters de todos os tempos, de adaptar o universo das HQs com uma amplitude e uma magnitude jamais vistas, de concluir uma saga iniciada há 11 anos, e primorosamente desenvolvida no decorrer de 22 filmes, ao longo dos quais os personagens foram cuidadosamente apresentados, além de tudo isso, Vingadores: Ultimato tem coração. E mais, esses heróis, que conhecemos por meio das histórias em quadrinhos, dos desenhos animados ou até mesmo dos próprios filmes, estão presentes em nosso cotidiano como jamais estiveram. É quase como se fizessem parte da nossa família e, de certa forma, fazem. Nos identificamos com eles, nos importamos com eles, gritamos de empolgação com suas vitórias, choramos nos momentos mais comoventes. Os Vingadores fazem parte da nossa vida! É por isso. Obrigado, do fundo do coração, a todos os envolvidos na execução deste filme, e longa vida ao maravilhoso Universo Cinematográfico Marvel!

AVANTE, VINGADORES!!!

“Parte da jornada é o fim. Por que eu estou me preocupando? Tudo vai dar certo exatamente como deveria… Eu te amo três mil.”.

Tony Stark – Vingadores Ultimato

Texto de Roberto Oliveira com colaboração de Lulu Gabriella.